1.8.07

Apresentação

Not for RENT! Nicht zu VERMIETEN! Não está para ALUGAR! Blog of aN DESoccupied building in Porto or How to REuse a homeless house?

“We should long ago have got into the habit of moving about, of moving freely(…), we haven’t asked ourselves why it was there and not somewhere else, why it was like this and not otherwise. Then, obviously, it was too late, our habits were formed”

Georges Perec, Species of Spaces


i. La città invisibili

As cidades confrontam-se, hoje, com o problema crescente da multiplicação de espaços abandonados, casas e edifícios desabitados que foram perdendo as funções sobre as quais estavam ordenados. Por outro lado, parecem ser do ponto de vista da sua forma e espaço, inadequados para responder às variantes e às exigências do habitar contemporâneo. Um habitar cada vez mais suburbano e menos urbano, baseado na lógica do carro, das rápidas comunicações, transformando o centro da cidade numa espécie de cenário turístico escrito em anglo-saxónico.

ii. This is not for rent!

O “regresso à baixa”, o lema da revitalização urbana, tenta impor um conjunto de práticas e estratégias, que visam adaptar os edifícios às novas condições contemporâneas. Nada de errado à partida. Mas mais importante seria, talvez, resgatar a ideia da cidade enquanto dispositivo de operações urbanas, sociais e culturais. Não quer dizer voltar atrás e refazer a configuração tradicional de cidade, mas sim devolver a urbanidade à cidade. A cidade como local de encontro de pessoas, de concretização de eventos, de acções sociais e práticas culturais. Um dispositivo sensível e orgânico aberto a novas formas de utilizar e reutilizar a cidade, de forma a valorizar o seu potencial representativo e urbano. O deserto hoje não está na margem sul, mas aqui bem no centro da cidade. Não basta enquadrar os sistemas político-jurídico-financeiros, é preciso que haja estratégia e que essa passe por uma compreensão global da cidade.

iii. How to ReUse a homeless city?

Deveríamos, por isso, pensar que talvez não sejam estes edifícios que estão errados, mas algumas das nossas práticas correntes. E que estes estão apenas silenciosamente à espera do nosso “regresso”. O diário gráfico produzido no blogue (http://opo-021.blogspot.com/), acerca deste edifício situado na ribeira reflecte sobre isso, sobre a excessiva “maquinização” das nossas casas e o seu encerramento em rotinas e práticas estabelecidas. Não há espaço de transgressão ou liberdade dentro desses apartamentos T0, T1, T2, tudo pertence a um conjunto imposto de medidas estandardizadas, de materiais e matérias predefinidas. Mas aqui não, o centro, a ribeira, este edifício, pertencem a uma outra lógica de construção e de concepção mais mutável, feita através do tempo. O edifício é uma sobreposição de matérias diferentes, de substratos coincidentes e anacrónicos. E o que interessa isso? O edifício do centro, não é mais a máquina ditatorial operativa e supra-funcional das casas suburbanas. Estas grandes salas “desproporcionadas” do século XIX, estas casas de banho em ferro e vidro feitas em suspenso nas fachadas dos logradouros, esta caixa de escadas gigantesca com a sua clarabóia, são um campo ilimitado de possibilidade de um habitar mais informal, mais aberto, descomprometido com o mercado e mais comprometido com a cidade. Não podemos, nem nos deixar soterrar pelo peso excessivo da história, limitando a necessária acção regenerativa, nem destruir tudo, deixando apenas o cenário das fachadas, para construir mais casas suburbanas.

iv. A matéria fluida da cidade

A arquitectura deve resgatar o que ainda subsiste, incorporar essa existência nos “novos” espaços, criando tipologias habitacionais e práticas quotidianas (privadas e públicas) mais dinâmicas, mais urbanas e menos conformistas e comodistas.
A cidade alemã de Berlim é o paradigma dessa relação intensa – que o Porto perdeu – entre habitante e cidade, entre criação e destruição, rotina e desejo, transgressão e regra. Promovendo e utilizando a cidade como palco de estratégias alternativas de habitar e de a habitar. A questão está, por isso, em saber adaptar, mas também em saber adaptarmo-nos. E é nesse jogo que corre a matéria fluida da cidade.

Pedro Levi Bismarck.
Junho 2007

Referências:
AUGÉ, Marc, Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da sobremodernidade; Lisboa, Bertrand, 1998.
CHRIS, Philo, Foucault’s Geography in Thinking Space, ed. Crang, Mike, London Routledge, 2000.
PEREC, George, Species of Spaces and Other Pieces, London, Penguin, 1999.
SAVAGE, Mike, Walter benjamin’s urban thought in Thinking Space, ed. Crang, Mike, London, Routledge, 2000.
TEYSSOT, Georges, Dis-eases of domicile in Nuevos Modos de Habitar, CTAV, Valência, 1996.
PRADO COELHO, Eduardo, As formas do Invisível in A Simbólica do Espaço, ed. Yvette Centeno, Editorial Estampa, 1991.