19.9.07

CITYSCOPE [open your windows and look to the city]*

Ainda o " se esta rua fosse minha"!
[I]
De facto, e como já se disse, estamos todos, afinal de contas, gratos à câmara e ao seu pelouro de trânsito por terem transformado um simples festival de rua, numa discussão e reflexão sobre a cidade e a baixa. Como já disse antes, não encontro razões lógicas nos argumentos apresentados pela CMP para não autorizar a realização desse evento. Vejo sim, apenas, pontos positivos neste tipo de eventos, que partem de um princípio de dinamização das ruas e do espaço público, não apenas com "copos" ou arraiais, mas com intervenções artísticas e culturais.

Mas este episódio, para mim, nem é surpreendente, nem é novo. É sim, paradigmático do fosso que subsiste na sociedade actual, entre a máquina pública, pesada e decadente e os novos organismos privados ou semi-públicos dinâmicos e arrojados. Entre uma classe média e artística, mais aberta, mais urbana, com uma formação europeia, que sobretudo está comprometida e quer intervir na cidade e uma classe política que resulta de uma formação pré 25 de Abril, que vive sobre formas e ideias que já não existem e fechada a qualquer tipo de inovação. Apenas isto explica, que se tenha deixado impavidamente ao abandono a totalidade do centro de uma das maiores cidade da Península Ibérica.


[II]
A reabilitação urbana arranca aos soluços, comandada pelo sector da construção civil que vê aqui uma nova possibilidade de continuar a facturar e do Estado, que vê aqui a saída para a crise do sector. Mas não há aqui planeamento estratégico, nem concertação, nem convicção, apenas necessidade pontual. E é este fosso que permanece cravado entre uma geração ávida de "poder" utilizar a cidade e a outra que permanece no "Poder", sem convicções e sem ideias.


[III]
A câmara não compreende, porque para eles é um bando de tipos novos, armados em “artistazecos”, sem compreender que é esse tipo de eventos, marcadamente cosmopolitas e urbanos, que trazem pessoas, portuenses e estrangeiros, que criam dinâmicas culturais nacionais e internacionais, que projectam o nome da cidade. Porque hoje a cidade, é como uma loja ou um negócio, quanto mais criativa e activa, mais “marca” irá vender, mais pessoas irá seduzir, mais negócios irá captar. A arte, enquanto manifestação cultural, é uma dessas formas que muitas cidades estão a utilizar para se evidenciarem no contexto europeu. E no Porto existem todas as condições para que isso aconteça, uma boa universidade (a que mais alunos recebe em Portugal), museus de nível internacional, um mercado cultural que apesar de todos os abalos continua dinâmico, uma cidade para reabilitar, um número cada vez maior de turistas e estrangeiros que estudam ou trabalham no Porto.


[IV]
Aquilo que o poder político tem de compreender é que a reabilitação não se faz apenas com reconstrução de casas, mas sim, promovendo e dando condições para que exista iniciativa por parte dos cidadãos. Que estes se sintam “comprometidos” no processo de transformação da cidade.
Se isso não for feito, se esse fosso, esta fissura não for ultrapassada, então o poder político vai perder os cidadãos e a cidade neste processo. Em vez, de combater, a câmara deveria antes, aliar-se, usar essa classe activa da população, dar-lhes as condições que eles precisam para intervir e não dificultar a sua acção. Sem isso, o processo de reabilitação é à partida um falhanço, um imenso cenário “para inglês ver”. Por isso, "open your windows and look to the city"!


*por Pedro Bismarck [opo.zine]