27.11.07

Provas Finais de Arquitectura 002*

FRAGMENTO: Representação da memória na arquitectura
Carlos Castro
“Frammento significa (...) un opera o un componimento di cui si sia perduta gran parte...” [1]


O fragmento, como tema e instrumento de projecto, é resposta decisiva à utopia da cidade contemporânea. O fragmento, neste âmbito, ultrapassa a sua definição e assume forma de processo. Um processo que caracteriza a evolução constante da cidade e que torna-se chave de descodificação da persistência da arquitectura como elemento essencial para actuar na cidade. O papel da arquitectura é semelhante ao acto de compor por fragmentos, de formar unidade a partir de peças simples e primárias. A cidade é composta por fragmentos que contribuem para a repetição de peças simples, que na sua individualidade não pretendem ser protagonistas centrais da construção da cidade, mas sim assegurar a continuidade das formas no tempo através das tipologias.

“O mundo inteiro e a memória inteira do mundo continuamente desenham a cidade.” [2]

O Tempo é determinante na compreensão dos processos compositivos e evolutivos do urbano e da arquitectura. Assim a história, enquanto interpretação do passado, permite a análise e permite ser encarado como elemento operativo de projecto.
O passado é fundamental para sistematizar as constantes, as transformações formais e tipológicas e consequentemente as permanências e persistências formais.

A acção do Tempo está presente na ruína dos edifícios adquirindo conotações de moralidade perante a Arquitectura. A ruína é a imagem do “fim” da Arquitectura, ou seja, do que foi objecto da acção Humana. Assim perceber que a “... lógica de “princípio” inclui a intuição do “fim”;....” [3] permite ver no passado o fundamento para o futuro. A estrutura teórica que suporta o projecto só pode ser operativa e realista quando ela for construída encarando o fim da obra arquitectural como algo natural. O conhecimento do “fim” pode ser deste modo instrumento poderoso da percepção da arquitectura na Natureza.

O fragmento como representação da degradação e da acção do Tempo é elemento que ultrapassa a cidade e torna-se instrumento de projecto. No sentido de melhor definir o seu fim inventa-se ruínas, ou constrói-se com estas. Tanto Souto Moura como Siza percebem a inevitabilidade do Tempo como actor externo no projecto da Arquitectura e assim a sua arquitectura tenta compreender e aceitar o Tempo como elemento constante. O fragmento como representação é de certa forma a tentativa de dominar o Tempo como matéria de projecto que se reflecte no lugar imaginado pelo arquitecto e também no tempo imaginado.

“No fundo de que se trata? Trata-se da introdução do tempo, da consciência do tempo.” [4]
opo
*[texto incluído na Prova Final do curso da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto]
opo
Referências
[1] “Fragmento é obra da qual se perdeu grande parte” (tradução livre) Aldo Rossi, Frammenti, in Aldo Rossi Architecture 1957-1987, p. 7
[2] Álvaro Siza, Quinta da Malagueira, in As Cidades de Álvaro Siza
[3] Jorge Figueira, Para Lá do “Contemporâneo” Regressando a Rossi, in J.A. nº 217, p. 51
[4] Fernando Távora, Fernando Távora - Coisa Mental (entrevista Jorge Figueira), in Unidade 3, p. 103
legenda
[esq] Ruínas romanas na cidade romana de Volubillis em Marrocos, [cen] Esquiço do Fórum de Roma, (arq. E. S. Moura) [dir] Recuperação do Mercado do Carandá em Braga (arq. E. S. Moura)
opo
bibliografía [3 livros essenciais]
ARÍS, Carlos Martí, La cimbra y el arco, Barcelona, Fundación Caja de Arquitectos, 2005.
ROSSI, Aldo, Introducción; Ciudad y proyecto, in Proyecto y ciudad historica - I Seminário Internacional de Arquitectura en Compostela, Santiago de Compostela, Colegio Oficial de Arquitectos de Galicia, 1976.
CARENA, Carlo, Ruína/Restauro, in Enciclopédia Einaudi, director Ruggiero Romano, Lisboa, I.N.C.M., 1984.