Parece que um grupo de moradores e comerciantes da rua de cedofeita retomou o projecto de construção de uma cobertura para esta mesma rua. Como arquitecto, ou quase arquitecto,torna-se difícil separar as ideias das formas, isso é, uma boa ideia pode não ser uma boa forma e uma má ideia pode eventualmente originar uma forma interessante. O processo de um projecto de arquitectura é complexo e não é taxativamente claro ou objectivo e aí reside a sua beleza enquanto forma de expressão artística.
Ao olhar para a foto [publicada em cima] do projecto de cobertura a minha reacção, depois do terror inicial, é de negação profunda e veemente. Neste, quase atentado urbanístico, utiliza-se uma estrutura em ferro e vidro, totalmente despropositada, esteticamente muito discutível, baseado num paradigma de shopping, estruturada com uma forma, que em nada se identifica com a rua. Para além da configuração formal, uma proposta deste género levanta muitos problemas conceptuais:
a) Destruição parcial da configuração arquitectónica da rua [e da sua beleza] e do fantástico remate que é a torre dos clérigos;
b) Uma relação difícil com as fachadas;
c) Os moradores perderão a relação com a rua e vice-versa;
d) Por outro lado, a própria foto é enganadora, porque ao adoptar-se um sistema de cobertura ao nivel do primeiro andar, a rua iria ficar certamente um pouco claustrofóbica;
e) Mas fará sentido cobrir a rua ao nivel dos últimos andares? [até porque existe uma grande diversidade de alturas das fachadas];
f) E depois a questão essencial: para que queremos fazer isso? Sem dúvida que irá proteger da chuva, mas não irá proteger do vento, nem da humidade. Irá nos retirar o prazer dos cada vez mais dias soalheiros que temos por ano. No verão, será certamente um sítio claustrofóbico e quente!
Assim, esta proposta [conforme aquilo que se vê], não irá resolver nenhum dos problemas a que se propõe, penso aliás, que irá piorá-los. Não me parece que o projecto tal como se apresenta seja uma mais valia funcional, estratégica e muito menos [menos, menos...] estética para a cidade [para não classifica-lo de atentado urbanistico!]
Mas isso não implica que a ideia não seja interessante e que não seja objecto de discussão e de reflexão e até de abertura um concurso público para arquitectos e até estudantes de arquitectura.
Mas este é um daqueles casos, em que mais que a ideia, o sucesso irá advir da qualidade da proposta apresentada, das suas possibilidade, multifuncionalidades, efemeridades e caracteristicas plásticas e estéticas. Porque aqui, como referi atrás, os imperativos de ordem funcional, são frágeis e de difícil resolução. Mas isso não implica, que não se pegue em equipas multidisciplinares, artistas, arquitectos, sociólogos, para se criar mais do que uma simples cobertura, uma estrutura com um potencial estético elevado. Mas que seja, menos pesada, mais mutável, versátil, variada, que inclua projectos de mobiliário urbano ou de esplanadas, que permita que os próprios comerciantes também possam usufruir da rua. Enfim, um projecto urbano que consiga responder a mais variáveis e não uma simples cobertura de shopping, descontextualizada e ultrapassada.
*Pedro Bismarck [opozine]
PS. Segundo o JPN, o projecto já teria recebido pareceres postivos do IPPAR. Mas a ideia ou a proposta em si? Espero que não seja a proposta...